sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Manifesto de empresários defende BNDES, mas especialistas criticam política de fomento


RIO, SÃO PAULO e BRASÍLIA - Manifesto publicado nesta quinta-feira nos cinco principais jornais do país por 12 entidades empresariais em defesa do BNDES criou polêmica entre especialistas. Sob o título "Em defesa do investimento", o texto das entidades - que reúnem indústrias que faturam R$ 672 bilhões, ou 21% da economia brasileira - afirma que o BNDES tem sofrido ataques que "ganharam vulto nas últimas semanas", critica os "juros estratosféricos praticados no Brasil" e apoia as políticas do banco. Mas especialistas divergem sobre qual deveria ser o papel de um banco de fomento num momento em que a economia brasileira cresce a um ritmo acelerado.

A iniciativa de publicar o manifesto partiu do presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luis Aubert Neto, que conseguiu o apoio de outros empresários.

- Nosso objetivo foi provocar a discussão. No Brasil, só se ouve os bancos - afirmou ele, que classificou de "terrorismo" as análises do mercado financeiro sobre a necessidade de elevar a taxa básica de juros (Selic).

A crítica mais recente ao BNDES está na capitalização, em 2009 e 2010, de R$ 180 bilhões feita pelo Tesouro Nacional, que capta recursos no mercado pagando Taxa Selic, atualmente em 10,75% ao ano, enquanto o banco de fomento empresta cobrando das empresas 6% ao ano. Para o economista Armando Castelar, da Gávea Investimentos, o ideal seria dar mais transparência à concessão de empréstimos com dinheiro público. Para ele, não deveria haver sigilo bancário para esses financiamentos:

- Assim, a sociedade poderia avaliar se o retorno social com os empréstimos, como geração de empregos, supera os custos de o cidadão pagar uma taxa básica de juros e carga tributária mais altas.

Castelar não vê sentido em empréstimos para grandes empresas como Petrobras e Vale, que já obtiveram grau de investimento pelas agências de risco e podem captar dinheiro lá fora a custo baixo.

Empresários criticam setor financeiro

No manifesto publicado nesta quinta-feira, as entidades empresariais - de setores tão diversos como têxtil, produtos químicos, siderurgia e indústria plástica - afirmam porém que os incentivos do BNDES "estão permitindo a crescer 2% do PIB em investimento, ou seja, mais de R$ 60 bilhões em investimentos adicionais".

Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast), José Ricardo Roriz, as críticas ao BNDES são "uma campanha orquestrada pelos bancos privados".

Perguntado se o manifesto não poderia ser entendido como uma declaração de guerra contra os bancos, Aubert, da Abimaq, rechaçou a ideia, mas não perdeu a chance de fustigar o outro lado.

- A média das operações aprovadas pelo BNDES é de R$ 250 mil, ou seja, se destina a pequenas e médias empresas. Esse dinheiro passa pelos bancos. Mas eles não têm interesse em aumentar isso, porque a comissão deles é pequena.

Procurada, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) afirmou que nada tem a comentar, até porque o setor financeiro é parceiro do BNDES no repasse dos financiamentos

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Vestuário, Aguinaldo Diniz Filho, disse que a decisão de publicar o manifesto em meio à campanha presidencial não tinha por objetivo político.

- É um movimento suprapartidário. O manifesto é apenas um reconhecimento do papel do BNDES.

O professor da PUC-SP, Antonio Corrêa de Lacerda, concorda com a posição os empresários:

- A China e a Coreia do Sul, nossos principais competidores, financiam o investimento a custo praticamente zero. Ou o Brasil cria instrumentos ou estamos fora da disputa internacional.

Para analista, BNDES concentra renda

Para o economista, não há subsídio, se for levado em conta que o investimento gera arrecadação.

Para o ex-professor da USP Joaquim Elói Cirne de Toledo, financiamentos com juros subsidiados devem ser concedidos apenas para inovação e para pequenas e médias empresas:

- Não há justificativa para se financiar grandes empresas. É transferir dinheiro do trabalhador para alguns poucos acionistas. É concentrar renda em um país já muito desigual.

Dentro do Banco Central (BC), prevalece a avaliação de que os juros subsidiados são um empecilhos para que a Selic seja menor. Para o BC, o crédito a taxas mais baixas acaba alimentando a demanda.

O peso dos créditos direcionados corresponde a um terço do total que circula no país. E a participação do BNDES na economia só cresce. Em 1997, os desembolsos do banco eram de R$ 19,1 bilhões. Este ano, pelas projeções, chegará a R$ 130 bilhões. Recentemente, o presidente do BC, Henrique Meirelles, deixou claro que os juros subsidiados podem interferir na política monetária. Oficialmente, o BC não se pronunciou nesta quinta-feira sobre o manifesto. O BNDES também se recusou a comentar a manifestação.


Fonte:oglobo.globo.com

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